A questão das Evocações nas Reuniões
Mediúnicas, método utilizado aos tempos de Allan Kardec, surge de vez em quando
nos encontros que realizamos para estudo da Mediunidade. É do conhecimento
geral, que o Codificador usava esse processo nas sessões da Sociedade
Parisiense de Estudos Espíritas, sendo também adotada fora dali pelos grupos
que se formaram à época. Também é sabido que as comunicações eram, em sua
grande maioria, Psicográficas.
Julgam alguns que por ser este o
método utilizado por Allan Kardec, deveria ser também o das reuniões mediúnicas
da atualidade. Alegam outros que aguardar que os Espíritos se comuniquem
espontaneamente é uma atitude passiva e alienante, e que significa
subordinação.
Vejamos como Kardec trata do assunto
em O Livro dos Médiuns.
Ele dedica um extenso capítulo às
evocações, o de número 25. Inicialmente diz que as manifestações dos Espíritos
podem ser de duas maneiras, pela evocação ou espontaneamente. Fala então das
vantagens e desvantagens dos dois processos.
Nas comunicações espontâneas,
esclarece, não chamar a nenhum Espírito em particular “é abrir a porta a todos
os que queiram entrar”. O contrário acontece quando se faz a chamada direta de
determinado Espírito, pois que isto “constitui um laço entre ele e nós.” (it.269)
Ressalta, em seguida, que as
comunicações espontâneas não apresentam inconveniente algum e que dessa maneira
“se podem obter coisas admiráveis.” Nos casos de evocação, prossegue,
“surpreende, não raro, a prontidão com que um Espírito evocado se apresenta,
mesmo da primeira vez. Dir-se-ia que estava prevenido.” E de fato, aduz,
havendo a preocupação antecipada em evocar determinado Espírito, este é
convocado pelo “Espírito familiar do médium, ou do interrogante, ou ainda um
dos que costumam frequentar as reuniões.” (it. 271).
No item 272, há uma afirmativa muito
interessante:
“Frequentemente as evocações oferecem
mais dificuldades aos médiuns (grifei) do que os ditados espontâneos, sobretudo
quando se trata de obter respostas precisas a questões circunstanciadas. Para
isto, são necessários médiuns especiais, ao mesmo tempo flexíveis e positivos
(grifos do original) e já em o nº 193 vimos que estes últimos são bastante
raros, por isso que, conforme dissemos, relações fluídicas nem sempre se
estabelecem instantaneamente com o primeiro Espírito que se apresente.”
O item 193 citado está no capítulo
referente aos médiuns especiais e ressalta a importância da afinização fluídica
que deve existir entre o comunicante e o medianeiro. Esta afinização é uma das
leis da comunicação espírita, conforme Léon Denis, em “No Invisível”.
Diante da alegação de que a
identificação do Espírito é mais fácil quando ele vem espontaneamente
declarando o seu nome, Kardec lembra que isto não significa autenticidade,
porque qualquer Espírito pode-se fazer passar por outro. Nenhuma garantia há, a
não ser a análise do conteúdo da mensagem e da linguagem do comunicante. São
estes os meios básicos de controle.
A propósito da identidade dos
Espíritos, Kardec escreveu o cap. 24 onde relaciona nada mais nada menos que 54
itens sobre o assunto, que auxiliam os médiuns e participantes em geral dos
trabalhos mediúnicos no tocante à identificação, qualquer que seja o gênero da
reunião. Infelizmente bem poucos conhecem estes itens. Todavia, a análise das
comunicações é aconselhada pelos próprios Espíritos, que, se são realmente
superiores, nada têm a temer.
Voltando ao cap. 25, it. 283-a , o
Codificador, tratando da evocação dos animais, interroga porque algumas pessoas
ao evocarem animais obtiveram respostas, ao que os Espíritos declararam: “Evoca
um rochedo e ele te responderá. Há sempre uma multidão de Espíritos prontos a
tomar a palavra sob qualquer pretexto.” Em seguida há uma nota de Kardec na
qual ele conta o caso dos pintassilgos, que é uma graça e vale a pena ser lido.
No cap. 17, “Da formação dos
médiuns”, Kardec recomenda ao aspirante a médium que não adote a evocação
direta de um Espírito (it. 203), explicando as dificuldades do processo e
aconselhando um apelo geral.
Estamos, portanto, diante de duas
opções, dois métodos diversos.
Em Léon Denis, todavia, encontramos
um tipo de reunião bastante aproximado da atual.. Na sua extraordinária obra
literária encontram-se diversas citações sobre as sessões das quais
participava. Em “No Invisível”, ele declara: “Não é indispensável fazer evocações
determinadas. Em nosso grupo raramente as praticávamos. Preferíamos dirigir um
apelo aos nossos guias e protetores habituais, deixando a qualquer Espírito a
liberdade de se manifestar sob sua vigilância. O mesmo acontece em grupos de
nosso conhecimento.”
Assim, como conciliarmos o método das
evocações praticadas por Kardec e o que lemos em O Livro dos Médiuns, já que a
soma das argumentações apresentadas pelo próprio Kardec parecem indicar que o
melhor método seria o das comunicações espontâneas?
Para responder a esta pergunta é
imprescindível ressaltar a natureza da missão de Allan Kardec. Ele era o
missionário escolhido e convidado para a grandiosa tarefa da codificação da
Doutrina dos Espíritos. A sua posição singular; as condições que o cercavam
únicas e especialíssimas. O seu tempo, bem curto ante a grandeza da obra.
Toda uma falange de Espíritos está a
postos para assessorá-lo nos dois planos da vida, sob a direção do Espírito de
Verdade. Kardec conta também com elementos encarnados em postos-chave que
viriam a contribuir para o êxito da missão. Médiuns, também escolhidos, o
rodeavam, absolutamente maleáveis, seguros, confiáveis, adestrados para uma
psicografia mecânica pura, de altíssimo nível, em grupos familiares e
posteriormente na Sociedade Parisiense de Estudos Espíritas. Além disso, há que
se levar em consideração o trabalho de pesquisa que deveria efetuar.
Pode-se observar parte dessa pesquisa
nas 66 comunicações inseridas na segunda parte de O Céu e o Inferno. As
evocações eram feitas a partir de notícias de falecimentos publicadas nos
jornais, ou nomes trazidos pelos participantes do grupo, desde que julgassem
serem oportunos e úteis para os estudos e pesquisas. Feita a evocação a
comunicação quase sempre era imediata. Kardec extraía da narrativa dos
Espíritos as teorias compatíveis, sendo esta, aliás, uma das características
marcantes da Doutrina: a teoria baseada em fatos. Os acontecimentos indicando
os fundamentos, os princípios norteadores.
Outros fatores contribuíram para que
se abandonasse a prática da evocação. Um deles foi o receio de haver indução,
sugestionamento ou animismo por parte do médium, além de que, este acabaria
quase que na obrigação de desempenhar, nesse contexto todo, o papel que dele se
esperava. Até mesmo para agradar ao dirigente e ao grupo. Outro aspecto é o do
constrangimento e inibição que, geralmente, acompanha esse tipo de prática,
decorrentes da expectativa formada em torno do médium.
Pode-se deduzir que a mudança do
método nas sessões mediúnicas seja, inclusive, por não ter o da evocação
produzido, após Kardec, os resultados esperados. Ou por não se conseguirem
médiuns em condições apropriadas. Ou as duas coisas simultâneas.
Entretanto, mesmo o processo da
evocação coloca os encarnados numa certa passividade, ou seja, à espera de que
os guias tragam o evocado ou que ele possa ou queira atender por si mesmo, ao
chamado nominal.
Acresce ainda, que só pelo fato de se
chamar determinado Espírito não quer dizer que ele virá; muitas dificuldades
existem a serem vencidas. E se houver resposta isto não significa que seja o
evocado. Entram aí os mesmos fatores que ocorrem nas comunicações espontâneas,
isto é, a hipótese de mistificação, animismo, indução, etc. E no caso da
evocação com um peso mais forte, pois exige-se, de imediato, a identificação.
No outro processo isto acontece de modo bem mais natural e só vem ao final da
comunicação, o que propicia ao médium ir-se afinizando, cada vez mais, com o
Espírito, durante o transcurso da mensagem e estar mais seguro quanto a sua
identidade.
É conveniente mencionar, contudo, que
em muitos casos o médium identifica de pronto o comunicante, mesmo antes de
iniciar a transmissão. Isto varia de médium para médium e depende também das
circunstâncias.
O essencial é que, nesse atual método
adotado pelas reuniões, não se deixe de lado a avaliação criteriosa das
comunicações, passando-as sempre pelo crivo da razão. Que cada um exerça o seu
direito pessoal e intransferível de analisar, de extrair ilações das mensagens.
A aceitação cega e mística é que tem
prejudicado a evolução dos trabalhos mediúnicos. O que, em última análise,
evidencia a falta de estudo da Doutrina. A não assimilação dos ensinamentos, ou
a sua deturpação por não compreensão dos mesmos, por ranços religiosos, opiniões
pessoais, etc.
Exercer a mediunidade com amor não
significa, em absoluto, desprezar o estudo, a avaliação meticulosa dos
trabalhos, a investigação equilibrada e benéfica. Nada impede que sejam
atendidas as duas partes.
Não sei quem estabeleceu em nosso
meio a idéia de que a mediunidade com Jesus, a caridade, o amor ao próximo são
incompatíveis com o estudo, a pesquisa, o aperfeiçoamento das atividades. Este
modo de pensar não se coaduna, de modo algum, com o verdadeiro sentido da
mensagem do Cristo.
Ao contrário, o que se vê, através,
especialmente, das contribuições mediúnicas que nos chegam por intermédio de
Chico Xavier, Divaldo Franco e Yvonne Pereira é o conselho constante, é o apelo
maciço dos Benfeitores Espirituais conclamando os espíritas ao estudo. E a
mediunidade exercida com amor, alicerçada nos ensinamentos de Jesus não abdica,
em momento algum, dos critérios mais rígidos de controle e adestramento da
faculdade.
Léon Denis legou-nos exemplos
admiráveis de reuniões onde se cultivava o respeito profundo aos guias, onde a
mediunidade era exercida com amor sem que houvesse prejuízo ao estudo e
investigação.
Assim, a evocação teve a sua época.
Como também o diálogo com os Espíritos através da psicografia. O retorno ao
método da evocação, inclusive, não dinamizaria as atividades mediúnicas e nem
propiciaria o surgimento de médiuns mais aptos e seguros. No caso destes é
exatamente o contrário: o surgimento de médiuns mais adestrados é que
possibilitaria (talvez) as condições para as evocações.
É recomendável também a leitura do
it. 330 de O Livro dos Médiuns, que fala a respeito dos dos Espíritos que
acompanham os participantes das reuniões. É muito interessante.
E Kardec conclui: “Perfeita seria a
reunião em que todos os assistentes, possuídos de igual amor ao bem, consigo só
trouxessem bons Espíritos. Em falta da perfeição, a melhor será aquela em que o
bem suplante o mal. Muito lógica é esta proposição, para que precisemos
insistir.”
Suely Caldas Schubert.
Fonte:
Grupo Socorrista Obreiros do Senhor
Jerônimo Mendonça Ribeiro