O orgulho vos leva a vos julgardes mais do que
sois, a não aceitar uma comparação que vos possa rebaixar, e a vos
considerardes, ao contrário, de tal maneira acima de vossos irmãos, seja na
finura de espírito, seja no tocante à posição social, seja ainda em relação às
vantagens pessoais, que o menor paralelo vos irrita e vos fere. E o que
acontece, então? Entregai-vos à cólera.
Procurai a
origem desses acessos de demência passageira, que vos assemelham aos brutos,
fazendo-vos perder o sangue frio e a razão: procurai-a, e encontrareis quase
sempre por base o orgulho ferido. Não é acaso o orgulho ferido por uma
contradita, que vos faz repelir as observações justas e rejeitar,
encolerizados, os mais sábios conselhos? Até mesmo a impaciência, causada pelas
contrariedades, em geral pueris, decorre da importância atribuída à
personalidade, perante a qual julgais que todos devem curvar-se.
No seu
frenesi, o homem colérico se volta contra tudo, à própria natureza bruta, aos
objetos inanimados, que espedaça, por não o obedecerem. Ah! se nesses momentos
ele pudesse ver-se a sangue frio, teria horror de si mesmo ou se reconheceria
ridículo! Que julgue por isso a impressão que deve causar aos outros. Ao menos
pelo respeito a si mesmo, deveria esforçar-se, pois, para vencer essa tendência
que o torna digno de piedade.
Se pudesse pensar que a cólera nada resolve,
que lhe altera a saúde, compromete a sua própria vida, veria que é ele mesmo a
sua primeira vítima. Mas ainda há outra consideração que o deveria deter: o
pensamento de que torna infelizes todos os que o cercam. Se tiver coração, não
sentirá remorsos por fazer sofrer as criaturas que mais ama? E que mágoa mortal
não sentiria se, num acesso de arrebatamento, cometesse um ato de que teria de
recriminar-se por toda a vida!
Em suma: a
cólera não exclui certas qualidades do coração, mas impede que se faça muito
bem, e pode levar a fazer-se muito mal. Isso deve ser suficiente para incitar
os esforços por dominá-la. O espírita, aliás, é incitado por outro motivo: o de
que ela é contrária à caridade e à humildade cristãs.
Segundo a
ideia muito falsa de que não se pode reformar a própria natureza, o homem se
julga dispensado de fazer esforços para se corrigir dos defeitos em que se
compraz voluntariamente, ou que para isso exigiriam muita perseverança. É
assim, por exemplo, que o homem inclinado à cólera se desculpa quase sempre com
o seu temperamento. Em vez de se considerar culpado, atribui a falta ao seu
organismo, acusando assim a Deus pelos seus próprios defeitos. É ainda uma
consequência do orgulho, que se encontra mesclado a todas as suas imperfeições.
Não há dúvida que existem temperamentos que se
prestam melhor aos atos de violência, como existem músculos mais flexíveis, que
melhor se prestam a exercícios físicos. Não penseis, porém, que seja essa a
causa fundamental da cólera, e acreditai que um Espírito pacífico, mesmo num
corpo bilioso, será sempre pacífico, enquanto um Espírito violento, num corpo
linfático, não seria mais dócil. Nesse caso, a violência apenas tomaria outro
caráter. Não dispondo de um organismo apropriado à sua manifestação, a cólera
seria concentrada, enquanto no caso contrário seria expansiva.
O corpo não dá impulsos de cólera a quem não
os tem, como não dá outros vícios. Todas as virtudes e todos os vícios são
inerentes ao Espírito. Sem isso, onde estariam o mérito e a responsabilidade? O
homem que é deformado não pode tornar-se direito, porque o Espírito nada tem
com isso, mas pode modificar o que se relaciona com o Espírito, quando dispõe
de uma vontade firme. A experiência não vos prova, espíritas, até onde pode ir
o poder da vontade, pelas transformações verdadeiramente miraculosas que se
operam aos vossos olhos? Dizei, pois, que o homem só permanece vicioso porque o
quer, mas que aquele que deseja corrigir-se sempre o pode fazer. De outra
maneira, a lei do progresso não existiria para o homem.
O Evangelho
Segundo o Espiritismo
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