Muitas
pessoas imaginam que não há grandes diferenças entre o remorso e o
arrependimento. No livro Aborto à Luz do Espiritismo, Eliseu Florentino da Mota
Jr., escreve que “dentre as causas determinantes das anomalias psíquicas, é
indubitável que o remorso assume especial relevância, porquanto, ao contrário
do arrependimento, que é o primeiro passo para a reabilitação diante de um erro
cometido, ele determina o surgimento do complexo de culpa, levando a pessoa que
eventualmente tenha errado a crises nervosas, chegando mesmo à loucura”.
Dessa forma,
podemos entender claramente essa diferença, deixando para reflexão o quanto o
remorso é prejudicial para o indivíduo.
No livro O
Céu e o Inferno, capítulo VI, intitulado “Criminosos Arrependidos”, Allan
Kardec descreve o contato feito com um jovem padre de nome Verger que havia
assassinado em 3 de janeiro de 1857, Monsenhor Sibour, arcebispo de Paris,
quando saia da Igreja de Saint-Étienne-du-Mont. Verger foi condenado à morte e
em 30 de janeiro executado. Em nenhum momento mostrou-se arrependido do seu
crime. Ele foi evocado no mesmo dia de sua execução e três dias depois. Nestes
contatos, quando Verger foi indagado “Qual a vossa punição?”, ele respondeu:
“sou punido por que tenho consciência da minha falta, e para ela peço perdão a
Deus; sou punido porque reconheço a minha descrença nesse Deus, sabendo agora
que não devemos abreviar os dias de vida de nossos irmãos; sou punido pelo
remorso de haver adiado o meu progresso, enveredando por caminho errado, sem
ouvir o grito da própria consciência que me dizia não ser pelo assassínio que
alcançaria o meu desiderato. Deixei-me dominar pela inveja e pelo orgulho;
enganei-me e arrependo-me, pois o homem deve esforçar-se sempre por dominar as
más paixões – o que, aliás, não fiz”.
Quando
tiramos a vida de alguém estamos retardando nossa evolução e a do outro, se ele
não souber perdoar. Além do mais, é muito triste chegar ao Mundo Espiritual e
sentir na consciência a dor e a vergonha de saber que mais uma oportunidade de
crescimento foi perdida.
Apesar de
tudo, de tantas e tantas quedas, Deus nos dá a oportunidade de reparação dos
erros cometidos através das vidas sucessivas, porque Ele espera de nós,
pacientemente, que aprendamos a colocar em prática os ensinamentos morais de
Jesus. Esses ensinamentos se iniciam no lar, no seio da família, onde existem
personalidades diversas, entendimentos diversos para um mesmo assunto,
espíritos comprometidos com a lei de amor que solicitaram na espiritualidade a
chance de reconciliação e reparação de faltas no aprendizado do perdão. Por
fim, aprendemos a duras penas que todo ato indigno de nossa parte contra nossos
irmãos termina sendo prejudicial a nós mesmos.
André Luiz
no livro Nosso Lar, descreve as palavras de consolo do benfeitor Clarêncio:
“Aproveita os tesouros do arrependimento, guarda a bênção do remorso, embora
tardio, sem esquecer que a aflição não resolve problemas”.
Elizeu
Florentino cita em seu livro que uma pessoa que cometeu aborto, por exemplo, e
está profundamente arrependida desse ato, pode ser levada, pelo arrependimento,
à ação benéfica de trabalhos beneficentes em prol de crianças carentes e até
mesmo à adoção, o que faz com que melhore sua autoestima e sua situação junto à
Lei divina, enquanto que o remorso, sem levar a criatura a agir, acaba por
criar nela anomalias psíquicas graves.
No livro
“Pensamento e Vida” (2), o Benfeitor Espiritual Emmanuel discorre sobre a
Culpa, esclarecendo-nos: “Quando fugimos ao dever, precipitamo-nos no
sentimento de culpa, do qual se origina o remorso, com múltiplas manifestações,
impondo-nos brechas de sombra aos tecidos sutis da alma.”.
Quer dizer o
Benfeitor que quando nos deixamos levar pelo erro e passamos a caminhar pelos
descaminhos da vida infringimos as Leis Naturais, e como estas leis estão
inscritas em nossa consciência, imediatamente nossa consciência se
intranquiliza gerando desconforto espiritual proporcional ao nosso entendimento
em relação à Justiça Divina.
No livro “O
Consolador”, Emmanuel responde a pergunta acima dizendo que “O remorso é a
força que prepara o arrependimento, como este é a energia que precede o esforço
regenerador”, ou seja, o remorso é a primeira reação que se dá na mente do
espírito, e por isso mesmo continua o Benfeitor: “Choque espiritual nas suas
características profundas, o remorso é o interstício para a luz, através do
qual recebe o homem a cooperação indireta de seus amigos do Invisível, a fim de
retificar seus desvios e renovar seus valores morais, na jornada para Deus.”.
Esta reação
produzirá um segundo sentimento, que é o Arrependimento, e Emmanuel, ainda em “Pensamento
e Vida” nos diz que “o arrependimento, incessantemente fortalecido pelos
reflexos de nossa lembrança amarga, transforma-se num abscesso mental,
envenenando-nos, pouco a pouco, e expelindo, em torno, a corrente miasmática de
nossa vida íntima, intoxicando o hausto espiritual de quem nos desfruta o
convívio.”.
Depreende-se,
das respostas do Benfeitor, que o choque espiritual, na condição de remorso, é
benção para a renovação, que se dará com a ajuda dos amigos espirituais, mas a
permanência no estado de remorso ou arrependimento pode aprofundar a crise
deflagrada, produzindo efeitos funestos em nós e no entorno social.
Falando de
arrependimento não poderíamos deixar de buscar a opinião dos espíritos
encarregados da Codificação e em “O Livro dos Espíritos” encontramos, na
questão de número novecentos e noventa, a seguinte indagação de Allan Kardec:
“O arrependimento se dá na vida física ou na espiritual?” Ao que os Espíritos
Superiores respondem: “Na vida espiritual; mas também pode ocorrer na física,
quando chegais a compreender a diferença entre o bem e o mal.”.
O
arrependimento, portanto, será mais ou menos profundo consoante o entendimento
moral do espírito, esteja ele encarnado ou desencarnado.
Em
sequência, na questão novecentos e noventa e um, o Codificador aprofunda o
assunto: “Qual a consequência do arrependimento na vida espiritual?” e a
resposta é a seguinte: “O desejo de uma nova encarnação para se purificar. O
Espírito compreende as imperfeições que o impedem de ser feliz e por isso anseia
por uma nova existência em que poderá reparar suas faltas.”.
Completando
o assunto, Allan Kardec refere-se à vida física perguntando na questão
novecentos e noventa e dois: “E o arrependimento ainda na vida física?” obtendo
a seguinte resposta: “É um começo de progresso, já na vida presente, se houver
tempo de reparar suas faltas. Quando a consciência aponta um erro e mostra uma
imperfeição, sempre se pode melhorar.”.
O remorso
pode ser entendido, então, como o primeiro sinal de que algo inadequado foi
perpetrado. E, como a lei de ação e reação se encarrega de apresentar o
resultado do erro ao seu produtor para que seja corrigido em todas as suas
consequências, o melhor a se fazer é criar, de imediato, as condições de reparo
enquanto se tem as possibilidades nas mãos, evitando-se a necessária
corrigenda, em futuro indefinido, permanecendo na consciência a condição de
devedor e a consequente intranquilidade íntima sempre traduzida por estado de
infelicidade.
O tempo de
que dispomos em uma existência não é eterno e amanhã pode ser muito tarde para
tentarmos corrigir as faltas cometidas. Devemos ter em mente que o momento de
agir é agora e que quanto mais tarde acordarmos para a necessidade do perdão,
mais comprometidos com a Lei divina estaremos no futuro. Vitor Ronaldo Costa,
em seu livro Gerenciando as Emoções, explica que “se alguém alimenta um
sentimento de culpa, em decorrência de um mal cometido intencionalmente, o
bom-senso recomenda que se busque a solução do impasse na prática inadiável de
uma atitude enobrecida. A anulação do remorso sugere a tomada de duas
providências essenciais: o cultivo da humildade e o pedido de perdão”.
Pensemos
nisso
Antonio
Carlos Navarro-.-Rede Amigo Espírita
Texto
original publicado na Revista Internacional de Espiritismo, edição nº 02, ano
2002.
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