A entrega total ao aspecto material
da vida faz com que assuntos importantes não recebam os devidos cuidados.
Para um grande contingente de
pessoas, o comportamento religioso é puramente protocolar, não toca o coração,
não cria raízes na alma. E' um procedimento passivo com hora marcada e tempo
definido para a sua prática, ou seja, o período que dura a reunião dos adeptos
nos seus núcleos, uma ou mais vezes por semana.
Fora isso: "a vida foi feita
para se viver", segundo o jargão popular. E como a maioria não se importa
com o futuro nem desta nem da outra vida, concentra toda a sua energia aqui e
agora, vivendo "intensamente" o que a vida pode oferecer. Com essa
entrega quase total às preocupações materiais, coisas importantes que fazem
parte da vida ficam sem cuidados, e só serão lembradas na velhice ou na doença
grave.
Uma delas é a reflexão sobre a morte.
Para os que se julgam "de bem com a vida", essa é a última coisa em
que querem pensar. Talvez isso se deva ao modo como historicamente se tem
tratado a morte, sempre pintada com cores escuras e enfeitada com os adereços
do horror e do pesar.
Se as religiões ao menos ensinassem
ao povo sobre o que seja esse fenómeno natural... Sendo uma questão de fundo
essencialmente moral, deveria ser um assunto já resolvido por elas. Mas, ao
contrário, a massa humana da Terra tem da morte vagas intuições que nem de
longe interferem na forma de pensar e agir na vida.
Mesmo sabendo que a morte nos
acompanha a cada dia, não se consegue falar dela sem antes persignar-se, sentir
um calafrio ou mesmo um leve mal-estar, já bem próximo do agouro. Para uns a
morte é apenas o "outro lado", para outros o desconhecido, para outros
tantos uma enorme "desmancha prazeres" que porá fim ao bem-bom da
vida. Essa forma de pensar não nos permite um desligamento fácil das sensações
curtidas durante toda uma vida e que impregnaram nosso corpo espiritual.
Por isso o Espiritismo ensina que as
pessoas "materializadas" passam apuros depois de morrer, porque a
vida continua e com ela, tudo o que acumularam em si. As vibrações do
prolongado culto à matéria, criando hábito e vínculos mentais, custam a se
"dissolver", causando sofrimento.
Se as religiões explicassem a morte,
saberíamos como melhor viver. Sabendo-nos imortais, com a possibilidade de ir e
voltar, entenderíamos que a morte é uma porta aberta, franqueando passagem.
Claro que a família poderia colaborar com as novas gerações na quebra desse
mito, mas como fazei isso, se nem ela sabe explicar?... Desde o banco rústico
até a universidade, a escola daria uma grande contribuição na formação
espiritual do ser humano se divulgasse mais as toneladas de estudos já
realizados pela orgulhosa ciência e que confirmam a plena atividade da alma
depois da morte.
Com essa aliança de saberes e convicções,
compreenderíamos que vida e morte se revezam continuamente por toda a natureza.
E, ao invés da desesperança e da incredulidade, poderíamos planejar o nosso
futuro com mais segurança, idealizar o ambiente em que gostaríamos de estar
depois de morrer, dedicando cada minuto da vida atual a juntar as moedas morais
que são aceitas do lado de lá.
Refletir sobre a morte é preparar-se
através do conhecimento. Como afirma Herculano Pires, "morrer é deixar o
condicionamento animal e passar à vida espiritual"1, onde não existe
inércia nem vazio.
Individualmente, não precisamos que a
ciência dita oficial dê a última palavra sobre a imortalidade da alma e seus desdobramentos,
e tampouco podemos ficar esperando que as religiões dogmáticas expliquem a
morte. Se procurarmos as respostas, sem medo nem preconceito, chegaremos após
um mínimo de esforço, apenas através do bom senso, à importante constatação de
que a vida continua sem interrupção, onde quer que estejamos — do lado carnal
ou do lado invisível —, e isso mudará tudo. Perceberemos de imediato que o
enorme esforço empregado na vida material para chegar a resultados não mais que
pífios e ilusórios poderá ser canalizado para a construção do nosso ideal,
individual e coletivo, referente ao Espírito.
Teremos então uma dimensão mais exata
da vida e a compreenderemos como um processo de transformação constante, sempre
adequado ao meio e as finalidades.
Cláudio Bueno da Silva
O Clarim, 1/14 Fonte: A Casa do
Espiritismo
(1) PIRES, J. Herculano. Educação
para a morte. Paideia.
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