Causa-te
surpresa o fato de ser o teu acusador de agora, o amigo aturdido de ontem, que
um dia pediu-te abrigo ao coração gentil e ora não te concede ensejo, sequer,
para esclarecimentos. Despertas, espantado, ante a relação de impiedosas
queixas que guardava de ti, ele que recebeu, dos teus lábios e da tua
paciência, as excelentes lições de bondade e de sabedoria, com as quais cresceu
emocional e culturalmente. Percebes, acabrunhado, que as tuas palavras foram,
pelo teu amigo, transformadas em relhos com os quais, neste momento, te rasga
as carnes da alma, ele, que sempre se refugiou no teu conforto moral. Reprocha-te
a conduta, o companheiro que recebeste com carinho, sustentando lhe a
fragilidade e contornando as suas reações de temperamento agressivo. Tornou-se,
de um para outro momento, dono da verdade e chama-te mentiroso. Ofereceste-lhe
licor estimulante e recebes vinagre de volta. Doaste-lhe coragem para a luta, e
retribui-te com o desânimo para que fracasses. Ele pretende as estrelas e
empurra-te para o pântano. Repleta-se de amor e descarrega bílis na tua
memória, ameaçando-te sem palavras.*
Não te desalentes!
O mundo é impermanente. O afeto de hoje torna-se o adversário de amanhã. As
mãos que perfumas e beijas, serão, talvez, as que te esbofetearão, carregadas
de urze.*
Há mais
crucificadores do que solidários na via de redenção. Esquecem-se, os homens, do
bem recebido, transformando-se em cobradores cruéis, sem possuírem qualquer
crédito. Talvez o teu amigo te inveje a paz, a irrestrita confiança em Deus, e,
por isto, quer perturbar-te. Persevera, tranquilo! Ele e isto, esta provação,
passarão logo, menos o que és, o que faças. Se erraste, e ele te azorraga,
alegra-te, e resgata o teu equívoco. Se estás inocente, credita-lhe as tuas
dores atuais, que te aprimoram e te aproximam de Deus.*
Não lhe
guardes rancor. Recorda que foi um amigo, quem traiu e acusou Jesus; outro
amigo negou-O, três vezes consecutivas, e os demais amigos fugiram dEle. Quase
todos O abandonaram e O censuraram, tributando-Lhe a responsabilidade pelo medo
e pelas dores que passaram a experimentar. Todavia, Ele não os censurou, não os
abandonou e voltou a buscá-los, inspirá-los e conduzi-los de volta ao reino de
Deus, por amá-los em demasia. Assim, não te permitas afligir, nem perturbar
pelas acusações do teu amigo, que está enfermo e não sabe, porque a ingratidão,
a impiedade e a indiferença são psicopatologias muito graves no organismo
social e humano da Terra dos nossos dias.
Divaldo
Pereira Franco. Da obra: Momentos de Felicidade. Ditado pelo Espírito Joanna de
Ângelis. Salvador, BA: LEAL, 1990.
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