Como a
Doutrina Espírita explica a existência de desafetos dentro da própria família?
Quase todas as famílias têm seus casos de desentendimento entre alguns dos seus
membros, muitas vezes verdadeira aversão sem nenhuma explicação na existência
presente.
“Por que certos
desafetos reencarnam como nossos familiares? Mesmo se o perdão for obtido em
uma das partes eles continuarão reencarnando próximos um ao outro em outras
vidas?”
É bom nós
sabermos – e quem fez essa pergunta já sabe disso – que é comum que antigos
desafetos reencarnem próximos um do outro, principalmente no meio familiar.
Numa mesma família geralmente há o encontro de antigos desafetos. Por quê?
Imagine que
você se mude para o outro lado do mundo, que você nunca mais tenha contato com
ninguém do Brasil, com ninguém que você conheceu aqui. Daqui a uns 40 anos,
quando eventualmente você se lembrar de alguém que você conheceu aqui, de quem
você vai se lembrar?
Você vai
lembrar das pessoas que você ama e das pessoas que você odeia. Talvez você não
ame ninguém, ou você não odeie ninguém. Mas você certamente formou vínculos de
afeto e de desafeto. Muitas pessoas que nós conhecemos nessa existência não irão
representar grande coisa para nós no futuro. São coadjuvantes em nossa vida.
Mas há os protagonistas em nossa vida, que são aquelas pessoas por quem nós
nutrimos sentimentos de amor e ódio.
São com
essas pessoas que nós temos vínculos. É a elas que nós estamos ligados. É
importante considerarmos que se nós sentimos ódio de alguém é porque muito
provavelmente antes de experimentarmos esse sentimento de ódio nós sentimos por
esse alguém algo muito próximo muito semelhante ao amor. Ninguém sente ódio de
alguém se nunca gostou desse alguém antes. As relações de ódio quase sempre
surgem a partir da traição, do engano, da inveja, da disputa desenfreada – mas
antes de se manifestar a traição, o engano, a inveja, a disputa desenfreada,
havia amor – não o amor verdadeiro porque nós ainda não sabemos amar de
verdade, mas algo muito próximo ao amor.
Se uma
pessoa que eu não conheço, ou um conhecido qualquer – se essa pessoa me trai, é
claro que eu não vou gostar, mas também não vou morrer de ódio dessa pessoa.
Mas se
alguém que eu amo – um irmão, um filho, o cônjuge – se um deles me trair, o
amor que eu sinto poderia se transformar em ódio: eu tenho um vínculo muito
forte com essa pessoa e esse vínculo permanece – ele apenas deixa de ser
positivo e se torna negativo.
Os nossos
grandes desafetos, então, são espíritos com quem nós já convivemos no passado,
em outras existências, e são espíritos de quem nós já gostamos, fomos grandes
amigos, talvez sócios, ou irmãos, ou amantes – já tivemos laços de amor no
passado.
Os espíritos
se atraem por afinidade. A reencarnação acontece normalmente por afinidade. É
um equívoco supor que todos nós passamos por um planejamento antes de
reencarnar. Isso é correto se considerarmos que a Lei de Deus (o grande
conjunto de Leis que nos regem) seja um planejamento – ou que comportem um
planejamento. Mas não há planejamento individual para cada espírito que
reencarna.
Nós nos
aproximamos, então, por afinidade. Nós temos vínculos aqui, temos laços de
afeto e desafeto com algumas pessoas, nós mantemos esses laços depois de
desencarnados, e esses laços permanecem ainda quando reencarnamos. São esses
vínculos que nos unem, que aproximam as pessoas em pequenos e grandes grupos.
– Qual é a
razão, na Lei de Deus, para que os desafetos se encontrem? Não seria melhor se
nós nunca mais encontrássemos os nossos desafetos?
Não. Se nós
não os encontrássemos novamente, nós não curaríamos as feridas produzidas por
esses laços de ódio. O ódio é uma doença do espírito. Enquanto nós sentimos
ódio, enquanto nós tivermos ódio dentro de nós, mesmo que bem controlado, mesmo
que nós nem percebamos que sentimos ódio – nós não nos curamos. E a única
maneira de curar essa doença chamada ódio – ódio e seus derivados: mágoa,
rancor, ressentimento – o meio de nós curarmos essa doença é nos rearmonizando
com nós mesmos e com os nossos desafetos.
Em relação
ao perdão: eu posso perdoar, posso me elevar espiritualmente e superar esses
laços negativos. Perdoar é desligar-se, deixar para trás. Perdoar alguém de
quem eu tive ódio é romper com esses laços de ódio, eu já não estou ligado a
essa pessoa por laços de ódio.
Poderíamos
pensar, então, que basta perdoar para nos vermos livres dos nossos desafetos.
É mais ou
menos. Quando eu perdoo eu me livro da doença, eu estou curado do ódio. Mas a
Lei é perfeita. A Lei de Deus é perfeita. Nada escapa da Lei. Temos que
considerar que nós contribuímos para a formação desses laços de ódio, nós
contribuímos para que essa desarmonia acontecesse. Se examinarmos as nossas
existências anteriores veremos que nós não somos vítimas. Podemos ter sido
vítimas numa determinada existência, mas fomos algozes em outra existência
anterior – às vezes espíritos se perseguem durante milênios, alternando as
posições de perseguido e perseguidor. Isso só termina com o perdão e a
rearmonização.
Referindo-se
a esses laços de desafeto, a essas relações de ódio, Jesus nos ensinou no
sermão da montanha:
“Concilia-te
depressa com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele, para que não
aconteça que o adversário te entregue ao juiz, e o juiz te entregue ao oficial,
e te encerrem na prisão. Em verdade te digo que de maneira nenhuma sairás dali,
enquanto não pagares o último centavo.” Mateus 5:25-26
Temos que
pagar até o último centavo. O que isso quer dizer?
Quer dizer
que nós não nos elevaremos de verdade enquanto estivermos em débito com as Leis
divinas.
Jesus disse
para entrarmos em acordo com o nosso adversário, para nos conciliarmos, ou nos
reconciliarmos com o nosso adversário – o adversário é esse desafeto que
reencarnou como nosso familiar. Temos a oportunidade de nos reconciliarmos
agora. Isso não quer dizer que temos que morrer de amores por esse familiar
nosso. Se nós construímos grandes diferenças um com o outro, a ponto de mal nos
suportarmos, dificilmente vamos amar esse desafeto, nesta reencarnação, como
nós amamos outras pessoas. Mas é preciso começar a rearmonização. É preciso tolerar;
compreender; ajudar, se for o caso; e querer o bem para essa pessoa, orar por
essa pessoa – isso é o mínimo que podemos fazer.
O perdão
liberta, é verdade. Mas não nos isenta de trabalharmos pela rearmonização, de
trabalharmos pela harmonia do universo.
A Lei de
Deus é pura harmonia. Deus é amor, é alegria, é prazer – para vivermos o reino
de Deus, que é o nosso próximo estágio evolutivo, temos que estar em plena
harmonia com as Leis de Deus.
Fonte: Morel Felipe Wilkon-Espírito Imortal