A
pluralidade das existências, cujo princípio o Cristo estabeleceu no Evangelho,
mas sem defini-lo mais que a muitos outros, é uma das leis mais importantes
reveladas pelo Espiritismo, no sentido de demonstrar a realidade e a
necessidade do progresso. Por essa lei, o homem explica todas as anomalias
aparentes que a vida humana apresenta; as diferenças de posição social; as
mortes prematuras, que sem a reencarnação tornariam inúteis para a alma as
vidas abreviadas; a desigualdade das aptidões intelectuais e morais pela antiguidade
do Espírito, que aprendeu mais ou menos e progrediu e que traz ao renascer a
aquisição de suas existências anteriores.
Com a
doutrina da criação da alma a cada nascimento, voltamos a cair no sistema das
criações privilegiadas; os homens são estranhos uns aos outros, nada os une, os
laços da família são puramente carnais; eles não são solidários a um passado em
que não existiam; com a crença no nada depois da morte, toda relação cessa com
a vida; não são solidários no futuro. Pela reencarnação, são solidários no
passado e no futuro; suas relações se perpetuam no mundo espiritual e no mundo
corporal, a fraternidade tem por base as próprias leis da Natureza; o bem tem
uma finalidade, o mal tem suas consequências inevitáveis.
Com a
reencarnação, caem os preconceitos de raça e de casta, de vez que o mesmo
Espírito pode renascer rico ou pobre, grão-senhor ou proletário, patrão ou
subordinado, livre ou escravo, homem ou mulher. De todos os argumentos
invocados contra a injustiça da servidão e da escravatura, contra a sujeição da
mulher à lei do mais forte, nenhum há que saliente, pela lógica, o fato
material da reencarnação. Portanto, se a reencarnação fundamenta sobre uma lei
da Natureza o princípio da fraternidade universal, ela fundamenta sobre a mesma
lei o da igualdade dos direitos sociais e, por conseguinte, o da liberdade.
Tirai ao
homem o espírito livre, independente, sobrevivendo à matéria, e tereis feito
dele uma máquina organizada, sem objetivo, sem responsabilidade, sem outro
freio que a lei civil e boa para ser explorada como um animal inteligente. Nada
esperando depois da morte, nada o impede de aumentar os gozos do presente; se
sofre, não tem nenhuma perspectiva a não ser o desespero e o nada como refúgio.
Com a certeza do futuro, de reencontrar aqueles a quem amou, o receio de rever
aqueles a quem ofendeu, todas as suas ideias mudam. O Espiritismo, embora
conseguisse apenas tirar do homem a dúvida com relação à vida futura, teria
realizado mais pelo seu progresso moral do que todas as leis disciplinares, que
algumas vezes o freiam, mas não o transformam.
Sem a
preexistência da alma, a doutrina do pecado original não é somente
irreconciliável com a justiça de Deus, que tornaria todos os homens responsáveis
pela falta de um só: seria um contrassenso e tanto menos justificável pelo fato
de que, segundo essa doutrina, a alma não existia na época em que se pretende
fazer remontar sua responsabilidade. Com a preexistência, o homem traz, ao
renascer, o germe de suas imperfeições, os defeitos que ele não corrigiu e que
se traduzem pelos seus instintos naturais, suas propensões a tal ou qual vício.
Este é o seu verdadeiro pecado original, do qual sofre naturalmente as consequências,
mas com a diferença capital de que sofre o castigo de suas próprias faltas e
não das faltas alheias; e esta outra diferença, ao mesmo tempo consoladora,
encorajante e soberanamente equitativa, de cada existência, lhe oferece os
meios de se redimir pela reparação e de progredir, seja se despojando de alguma
imperfeição, seja pela aquisição de novos conhecimentos, até que,
suficientemente purificado, ele não tem mais necessidade da vida corporal e
pode viver exclusivamente da vida espiritual, eterna e bem-aventurada.
Pela mesma
razão, aquele que progrediu moralmente traz, ao renascer, qualidades naturais,
como o que progrediu intelectualmente traz ideias inatas; está identificado com
o bem; pratica-o sem esforço, sem cálculo, por assim dizer, sem pensar. Aquele
que é obrigado a combater suas más tendências ainda está na luta: o primeiro já
venceu, o segundo procura vencer. Há, portanto, virtude original, como há saber
original e pecado, ou melhor, vício original.
A GÊNESE-ALLAN
KARDEC
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